21/11/2007

Arqueossismologia - primeiras referências nacionais!?

De há dois anos a esta parte tenho dedicado a minha investigação à Arqueossismologia. Desta investigação resultou um artigo que será brevemente publicado numa revista ainda a definir.


Mas quero fazer um elogio a um recente colóquio a que assisti. A palavra de elogio dirige-se a todos aqueles que contribuíram para a sua realização - desde a sua organização até aos próprios comunicadores.

O II Encontro de Arqueologia da Arrábida, numa homenagem ao arqueólogo A. I. Marques da Costa, focou-se numa abordagem panorâmica de muitos dos trabalhos que se têm vindo a desenvolver na região do distrito de Setúbal mas, e é aqui que quero chegar, destacou-se pela referência à hipótese arqueossismológica para a destruição de alguns sítios conhecidos, nomeadamente do período romano.

Embora ainda pouco sustentada, a arqueossismologia começa a ser posta em prática e a sua aplicabilidade definitivamente reconhecida.

Pelas pessoas do Doutor Carlos Tavares da Silva e Doutora Françoise Mayet a hipótese sísmica para a destruição e abandono de alguns sítios costeiros do período romano, sustentada a partir de níveis arqueológicos balizados cronologicamente entre o final da segunda metade do sec. II d.C. e os início da primeira metade do sec. III d.C., tomou forma numa apresentação bastante equilibrada e coesa sob o ponto de vista científico, uma vez que se baseou na comparação crono-morfológica de níveis arqueológicos de abandono idênticos.

Tenho, contudo, uma opinião muito pessoal e restrita em relação a essa abordagem hipotética (aliás só a afirmo aqui porque também já o havia feito pessoalmente à Doutora Françoise Mayet embora de uma forma mais resumida). A minha opinião em relação à hipótese, ainda que bastante tentadora, de abandono daqueles sítios arqueológicos por causa de um forte sismo seguido de um tsunami, é ainda um pouco precipitada. Apesar de se basear em fontes seguras que afirmam e comprovam a existência de um forte episódio sísmico no golfo de Cádiz, mais concretamente na cidade romana de Baelo Claudia, ainda não foram encontradas provas arqueossismológicas de um evento como este noutros sítios costeiros do mesmo período mais a sul do nosso território, factor que seria essencial para suportar a teoria de um sismo com epicentro no oceano atlântico e que teria afectado toda a costa SW da Península Ibérica. Segundo o artigo de P. G. Silva et al (2005) - Archaeoseismic record at the ancient Roman City of Baelo Claudia (Cádiz, south Spain), o epicentro sísmico que destruiu a cidade romana de Baelo terá sido, em princípio, na zona de Gibraltar.



Para além disso este artigo ainda refere outros dados que não jogam a favor da recente teoria luso-francesa: foram encontrados vestígios de destruição sísmica que apontam para dois episódios diferenciados - um por volta de 50 d.C. e outro por volta da segunda metade do século IV d.C. Muito embora tenham deixado em aberto a hipótese de um epicentro mais afastado da costa de Cádiz - talvez no atlântico -, e até façam referência à eventualidade de toda a costa SW da Península Ibérica ter podido observar diversos episódios sísmicos ao longo da história, os autores desse artigo preferem enveredar por uma hipótese mais localizada para a origem das duas catástrofes.

Concluindo, nem as datas apresentadas para os sítios romanos no actual território português (numa área que se estende desde Setúbal até Sines) se coadunam com as da cidade de Baelo, nem a hipótese do epicentro sísmico comum para a destruição das duas zonas (Setúbal e Cádiz) se verifica muito provável. Contudo, relembro que os autores do referido artigo não afirmaram categoricamente a sua certeza quanto ao local do epicentro sísmico. Basearam-se apenas em probabilidades geologicamente atestadas.

Ainda assim queria deixar aqui espelhado o meu agrado pelo esforço multi-disciplinar efectuado pelos intervenientes e pela forma como foi proposta tal teoria que para muitos ainda é extraordinariamente estranha. De uma forma leve, mas nem por isso leviana, foi tocada pela primeira vez em Portugal e num congresso a que isso não se prestava, a hipótese arqueossismológica para a destruição de um sítio arqueológico, ou, neste caso, de vários sítios do mesmo período.

A arqueossismologia, ou por outra o estudo do impacto dos sismos em sítios arqueológicos, começa a ser posta em prática e a sua utilidade efectivada nos estudos e trabalhos de arqueologia em Portugal.


Apraz-me saber que o meu esforço de divulgação deste ramo da geoarqueologia não foi inútil, muito menos inoportuno!

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