Ainda nem tinha começado a ler o Voo melancólico do Melro e o Carlos já me tinha quebrado a defesa com o nome próprio.
Carlos Tê, letrista, poeta, escritor, e sobretudo um gajo esperto, decidiu escrever um livro - acredito que ele não se importe que lhe chame LIVRO - no fim do século passado.
Só agora é que a minha ignorância o descobriu. O Livro. E passados dez anos.
No início (da história, do livro e da idade narrada) o autor criança descreve as brincadeiras. Até aqui tudo normal. Apresenta algumas pessoas, o si próprio Vladimiro e, outra vez, não estranhei.
Na página 14 este grandessíssimo e alternadíssimo Escritor portuense, que só é pena ser portista, parte-me o estatuto de leitor desinteressado e oferece-me este entretanto:
"(...) O peito prometia um canal de delícias como o da Luzia quando se debruçava sobre a canastra de fanecas. Sentia uma pressão na zona do tronco onde a peste da Guiomar afirmava estar a alma. A pressão era agora um tropel de cascos no chão da alma. Doía mesmo. Mas não era uma dor de quando se leva uma canelada; era uma dor boa, que cortava a respiração. E aí pensei no amor, a palavra dos filmes que as personagens invocavam por tudo e por nada. Seria amor, aquela pressão pneumática na zona do tronco onde vivia a alma?"
Ora bolas!!! Sei que há pessoas, escritores e wanna be's, que crêem que para se escrever bem é preciso, para além do jeito, técnica, riqueza vocabular, cultura, investigação, e muito engenho. Enganar-me-ei se disser que este senhor, apenas usou a vontade para escrever isto!?
Há coisas que são mesmo assim. E esta coisa - qual coisa qual quê... é mas é um grande livro é o que é, e ainda nem o li até ao fim - fez-se com outra coisa qualquer que lhe podemos chamar de talento. Mas eu, prefiro chamar-lhe: -"Gaita, sacana que escreves bem que te fartas e aposto que não sabes que o fazes tão bem".
Uma pessoas que diz para nunca se voltar "ao lugar onde já foste feliz"... Ou então que "não se ama alguém que não ouve a mesma canção"... Só podia escrever um livro que ou muito me engano, ou será um dos livros deste minha curta vida de leitor com pouco líquen.
Leia-se o Voo melancólico do Melro. É quase obrigatório. Se calhar foi a "sorte" ou a "sina". Mas agora tenho "um mundo à [mesa de] cabeceira".
Ps: - Senhor Miguel Sousa Tavares, podia aproveitar para conhecer este seu conterrâneo e amigo de bancada!!!
2 comentários:
"Enganar-me-ei se disser que este senhor, apenas usou a vontade para escrever isto!?"
Provavelmente sim. Quantos textos menos bons terá ele escrito antes deste? Dezenas, centenas, milhares?! Uma cauda de escrita no seu cometa criativo? Também não sei.
O que sei, e sinto, (e sem contrariar a imensidão de beleza do teu texto) é que todos os dons melhoram se forem trabalhados... talvez pudesses trabalhar o teu.
Eu, agradeceria (lendo) muito!
"Mas esse teu mundo era mais forte do que eu"
Também do Carlos Tê.
:(
A.P.
Enviar um comentário